segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Entrevista com Marcelo Manzano


Sinto-me abraçado pela voz e delicadeza que Marcelo Manzano imprime em suas interpretações ao piano. Ao ouvi-lo penso numa qualidade interpretativa perdida nas músicas que chegam ao rádio já há algumas décadas e lamento que tal sofisticação, por falta de execução, seja tomada por erudita e, em razão disso, inacessível ao grande público. Um equívoco! Seu disco, “Falo por meu coração” (2011), no qual homenageia Dick Farney, o notório cantor e pianista brasileiro que as novas gerações não descobriram, apresenta um repertório de grande beleza já, de certa forma, assimilado outrora, quando havia espaço a este tipo de produção nas rádios. Lembro de em nosso encontro, ocorrido em 06/12/12, Marcelo afirmar que não é um músico de shows, ou seja, quando o público pagante vai a um local exclusivamente para assistir a um artista, mas de apresentações, que faz trilha ao encontro das pessoas e, vez ou outra, tem a atenção de um espectador capturado por sua interpretação. Embora se apresentar nas antigamente chamadas boates, que hoje têm piano bares e restaurantes sofisticados como substitutos, tenha sido um caminho que o próprio Dick Farney e outros músicos do gênero fizeram, penso que se ainda houvesse espaço na grande mídia para o tipo de tratamento que Manzano dá ao seu repertório, teríamos também o privilégio de ouvi-lo mais em disco. Ainda bem que, dentre as reconfigurações da indústria cultural, a produção independente também viabiliza trabalhos como o dele, dentre outras características, importantes para o resgate de nossa memória musical. E quando isso ocorre com obras que possuem assinatura própria, como a de Marcelo Manzano, deve-se usufruí-las e compartilhá-las. As fotos do nosso encontro no seu apartamento em São Paulo são de Bruno Caetano. A entrevista segue abaixo:

1. Quais os primeiros contatos que você se lembra de ter tido com a arte como espectador?

Meus pais sempre gostaram muito de música. Eles tinham um grupo de amigos que fazia saraus e, desde muito pequeno, eu participava dessas reuniões.

2.  Qual a sua formação?

Sou formado em Direito, embora tenha exercido pouco tempo. Estudei piano erudito, mas não cheguei a me formar. Hoje sou pianista e cantor e trabalho com repertório de música popular.

3. Quando e como lhe ocorreu ser artista? Houve um momento no qual esta foi uma intenção clara ou foi algo que aconteceu?

Eu comecei os estudos de música muito cedo. Estudei piano erudito e violão popular, mas inicialmente não imaginava me profissionalizar como músico. Cheguei a advogar por um período curto de tempo, mas logo percebi que não gostava da coisa e decidi estudar para prestar concurso público. Como precisava de uma renda para me manter, aceitei o convite de um amigo para tocar e cantar no bar dele. Então eu estudava durante o dia e tocava à noite. Até que cheguei à conclusão que a profissão que eu realmente desejava e tinha aptidão era a música. A partir daí abandonei o direito e me dediquei integralmente à arte.

4.  Você pode nos contar um pouco da sua carreira?

Comecei a carreira tocando em bares na cidade de Londrina em 1992. Mas a cidade nessa época era muito limitada artisticamente e percebi que, se quisesse continuar na profissão de músico, teria que ir para uma cidade maior e com mais campo de trabalho. Então, em 1995, me mudei para São Paulo, onde moro até hoje. 
    
5.  Quais artistas lhe influenciaram?

Tenho uma infinidade de influências. Dos artistas nacionais citaria Tom Jobim, Johnny Alf, Dick Farney, Ivan Lins, Edu Lobo, Chico Buarque e outros. Dos artistas internacionais, citaria Tony Bennett, Johnny Mathis, Nat King Cole, Barry Manilow, Frank Sinatra e outros.

6.  Quando passou a se considerar profissional?

Quando parei de estudar para concursos públicos e passei a me dedicar totalmente à carreira musical.

7.  Qual era a ideia que você tinha da profissão antes de exercê-la?

Que era uma profissão muito difícil, sem estabilidade alguma e pouco valorizada. Por isso o receio de exercê-la.

8.  Qual é a ideia que você tem da profissão hoje que a exerce?

Que é uma profissão muito difícil, sem estabilidade alguma e pouco valorizada... A diferença é que hoje não tenho mais receio de exercê-la, e sim, muito orgulho dela.

9.  Como é o seu dia de trabalho?

Hoje em dia tenho um trabalho fixo duas vezes por semana e nos outros dias faço eventos e festas.

10.  Seu trabalho foi beneficiado com a internet e as redes sociais? Como?

Foi muito beneficiado, principalmente depois que eu lancei o meu CD. Elas foram importantes não só na divulgação, mas também na comercialização dos discos. 

11.  É possível pagar as contas tendo a arte como ofício? Como você faz?

Sou um artista privilegiado, pois sempre tive trabalhos fixos e sempre toquei em bons lugares. Mas essa não é a realidade da maioria dos músicos, infelizmente.

12.  Como você acredita que será o futuro da sua profissão?

Cada dia tem menos lugares com música ao vivo. Muitos lugares que contratavam músicos hoje têm só música mecânica, um DJ ou senão um aparelho de karaokê...  Eu acho que o futuro da minha profissão é trabalhar com eventos, pois sobreviver só tocando na noite está cada vez mais difícil.

13.  Fale sobre o que você gostaria do seu trabalho, mas nunca lhe perguntam.

Gostaria que houvesse mais respeito com o músico. Que os donos de bares não considerassem a música ao vivo uma “despesa necessária”. Que os frequentadores dos bares não achem que o músico é uma jukebox onde você põe uma moeda, escolhe qualquer música e ele toca. Cada músico tem um estilo e, se você não atende a um pedido, não é por má vontade, mas sim porque a música não faz parte do seu repertório. Gostaria que houvesse respeito dos músicos para com os músicos. A classe é extremamente desunida e muitos não pensam duas vezes em passar a perna num colega. Já passei pela situação de um músico chegar no lugar que eu tocava e se oferecer para tocar no meu lugar por um cachê menor que o meu... Se a Ordem dos Músicos do Brasil realmente fizesse alguma coisa por nós músicos, além de cobrar a anuidade, talvez isso não acontecesse. E, por fim, mas não menos importante, é que hoje em dia o cara se diz músico só porque tem um teclado onde ele aperta um botão e o bicho toca sozinho! Ou senão ele leva um computador com os playbacks e acha que pode animar um bar ou um evento cantando como se fosse um karaokê...  Eu gostaria que as pessoas, donos de bares e contratantes em geral discernissem o músico que estudou, se preparou para a profissão e vive dela, daquele “curioso” que nunca estudou, que acha que a música pode ser um “bico” e que apertar botão de teclado ou computador é ser artista!!


Para conhecer mais do trabalho de Marcelo Manzano, visite sua página oficial:
Ouça a música “Tenderly”, que faz parte do repertório do disco “Falo por meu coração”:
Para ver mais fotos tiradas por Bruno Caetano do encontro com o artista, visite a página do Cultura Artfício no Flickr:


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