quinta-feira, 28 de março de 2013

Entrevista com Caio Gallucci

"Quando a luz está apagada
E ainda faltam placas na estrada
Que sinalizem algum sentido
Entre o que é livre e o que é proibido
Sempre podemos largar o emprego
Trocar de amores e buscar algum sossego

Quando tudo é quase nada
Podemos sonhar e ter ilusões
De dar um beijo clandestino
De língua na boca do destino
E no bloco de espantalhos
Espantar a dor de tanta solidão

Meia volta pra recomeçar
Meia volta para algum lugar
Meia volta sobre o precipício
Meia volta da porta do hospício"

Isso é o que diz a música "Beijo clandestino", de Lucina e Paulinho Mendonça, e parece bastar para contar um pouco sobre a história e as escolhas do fotógrafo Caio Gallucci, cuja maior especialidade é clicar espetáculos teatrais e seus bastidores. "Sempre podemos largar o emprego / Trocar de amores e buscar algum sossego". Coragem, amigos! Os nomes das montagens que originaram as fotos do mural do artista, em autorretrato no canto superior esquerdo da imagem, seguem após a entrevista.

1. Quais os primeiros contatos que você se lembra de ter tido com a arte como espectador(a)?

Sem dúvida foi com o cinema. Meu avó era cineasta amador e tinha um cinema em sua casa. Cresci assistindo aos filmes que ele passava. O que eu mais gostava e pedia sempre para ele passar era uma versão de “João e o pé de feijão” chamada “Jack e os feijões mágicos” (1967), com Gene Kelly, que misturava cinema e desenho. Às vezes ele me deixava subir na sala de projeção, ver os projetores, a moviola, e até trocar as películas quando o rolo acabava. Era uma emoção porque ali era quase que um lugar sagrado. Uma coisa meio como no filme “Cinema Paradiso” (1988).

2. Qual a sua formação?

Eu sou advogado formado pela PUC/SP, tornei-me fotografo após 7 anos de advocacia, quando transformei o hobby em profissão. Fiz cursos de fotografia no Brasil no MIS - Museu da Imagem e do Som, e no Fotoclube Bandeirantes. E nos EUA no ICP - International Center of Photography, em Nova York. Atualmente estou fazendo um curso de Direção de Fotografia para Cinema, na AIC - Academia Internacional de Cinema.

3. Quando e como lhe ocorreu ser artista? Houve um momento no qual esta foi uma intenção clara ou foi algo que aconteceu?

A vontade sempre existiu, mas era como um sonho distante, intangível. Com o passar dos anos, o sonho foi criando forma e a insatisfação no mundo jurídico serviu como impulso para mudar. Coincidentemente ou não, ganhei um premio num concurso de fotografia promovido pela empresa que trabalhava e neste momento eu já estava bem próximo à realidade artística. A partir daí o processo foi mais natural do que eu podia imaginar.

4. Você pode nos contar um pouco da sua carreira?

Como eu disse antes, minha carreira começou a partir de um hobby. Sempre gostei de fotografia e de fotografar. Comprei meu equipamento em Nova York, após largar a carreira jurídica e comecei a fazer fotos. No início já comecei fazendo books para atores e eventos sociais, depois passei a fazer stills de jóias e produtos e, então, espetáculos teatrais, dos quais registro tanto as cenas como os bastidores. O universo do teatro é muito rico e quem gosta, gosta muito. Fotografar peças é bastante desafiador, pois você precisa traduzir em apenas um clique o trabalho de praticamente todos os envolvidos na criação. Os atores, diretores, maquiadores, figurinistas, coreógrafos, cenógrafos, iluminadores, enfim, a arte de todos deve estar na foto, através do olhar do fotógrafo. E após isso, atender às expectativas dos produtores de cada espetáculo. Já nos bastidores a liberdade artística é maior e o trabalho pode ser ainda mais autoral.

5. Quais artistas lhe influenciaram?

São inúmeros e de maneira diversa. Acho que esse tipo de influência é perene. Sou muito fã do Mario Testino, que também foi advogado antes de ser fotógrafo.  Admiro sua trajetória e obra. O trabalho do Steven Klein também é incrível. Não posso deixar de falar da Lenise Pinheiro, Jairo Goldflus e João Caldas, que fazem um trabalho belíssimo no Teatro. Ultimamente tenho recorrido muito aos museus em busca de inspiração. Tive a oportunidade de visitar a Galleria degli Uffizi, em Firenze, e sem dúvida os trabalhos de artistas como Botticelli, Michelangelo e Caravaggio passaram a tem um significado diferente e ainda mais especial para mim. Relacionar a arte à sua época e ver como o trabalho era criado, executado e valorizado nos trás uma dimensão incomensurável do que é a Arte. Sem falar, claro, no estudo da luz e técnicas utilizadas em cada período. É uma redescoberta a cada visita.

6. Quando passou a se considerar profissional?

O primeiro momento que parei para pensar nisso foi em meados de 2010, cerca de um ano após a transição profissional, quando uma foto minha, do musical “A Gaiola das Loucas” e outra do “Hairspray”, foram publicadas na mesma semana, na Veja Rio e na Veja SP, respectivamente. Ver dois trabalhos meus divulgados na mesma data nessas duas cidades me trouxe à consciência que eu era realmente um fotógrafo.

7. Qual era a ideia que você tinha da profissão antes de exercê-la?

Pensava, inicialmente, que não seria possível sobreviver apenas com a fotografia, principalmente no Brasil, onde a arte não é tão valorizada como nos países de primeiro mundo. Talvez por isso sempre tive a idéia de que ser fotógrafo era apenas um sonho (inviável).

8. Qual é a ideia que você tem da profissão hoje que a exerce?

Hoje sei que há muito campo para a fotografia e que o reconhecimento existe, ainda que tímido. Sou suspeito para dizer, pois me sinto realizado nessa profissão. É através da fotografia que tenho a oportunidade de me expressar artisticamente, seja contando uma história, seja trazendo um momento de pausa e reflexão. A fotografia pode ser um retrato da realidade ou ser completamente abstrata. O fotógrafo que irá decidir o que deve compor aquele frame, o que a luz irá revelar e a sombra esconder. É quase um jogo.

9. Como é o seu dia de trabalho?

Meu cotidiano é uma loucura. Principalmente porque gosto de fotografar e tratar as minhas fotos. Assim, acumulo um certo trabalho, mas garanto que o material final tenha 100% do meu olhar. Fiz escolhas na fotografia, mas nunca quis diminuir meus horizontes. É uma linguagem universal, que já me proporcionou trabalhos em Nova York e na França. Fotografando Teatro, jóias, Arquitetura, books, Moda e casamentos eu trabalho de segunda a segunda. E quando me trazem algo novo e desafiador, eu crio lugar na agenda e fotografo.

10. Seu trabalho foi beneficiado com a internet e as redes sociais? Como? 

Sem dúvidas é a maneira mais rápida, prática e barata de divulgar meu trabalho. A abrangência do Facebook e Instagram são assustadoras. O mundo está em constante mudança e evolução, quem não acompanha o ritmo fica para trás. Os prós são bem maiores e concretos que os contras.

11. É possível pagar as contas tendo a arte como ofício? Como você faz?

Antes de qualquer coisa, trabalhar com o que se gosta é primordial. Não há salario que pague isso. Foi-se o tempo em que se escolhia uma profissão para a vida toda. Mas como qualquer outro profissional, o fotógrafo também busca uma boa remuneração. Não é fácil, até porque todo equipamento fotográfico é bastante caro, então gasta-se muito também, mas é sim perfeitamente possível!

12. Como você acredita que será o futuro da sua profissão?

É bem difícil dizer, porque atualmente todo mundo fotografa de alguma forma, seja com o celular ou com uma boa câmera e, assim, todos se consideram fotógrafos. É triste mas muitas vezes o Fotógrafo tem que se identificar como “Fotógrafo Profissional”. Quando na verdade a divisão deveria ser entre “Fotógrafos” e “Fotógrafos Amadores”. Eu nunca fui um “Advogado Profissional”, mas apenas “Advogado”. Um colega outro dia publicou a foto de uma capa de revista com a incrível manchete: “Seja Fotógrafo em um dia”, é tão absurdo que dispensa comentários. No fundo, acho verdade que essa massificação da fotografia irá estabelecer uma fenda bem grande, distinguindo os bons profissionais, que levam a profissão e a arte a sério do amadorismo.

13. Fale sobre o que você gostaria do seu trabalho, mas nunca lhe perguntam.

Acho que nunca tiveram coragem de me perguntar se eu havia me arrependido de ter trocado o Direito pela Fotografia. A resposta flui, sem titubear: Nem por um dia!

Nome dos espetáculos retratados no mural (em sentido horário):
Imagem 02Espetáculo: Mamma Mia!
Imagem 03 - Espetáculo: Priscilla - Rainha do Deserto
Imagem 04 - Espetáculo: Cabaret (bastidores)
Imagem 05 - Espetáculo: Hairspray
Imagem 06 - Espetáculo: Avenida Q
Imagem 07 - Espetáculo: Cabaret
Imagem 08 - Espetáculo: Alô, Dolly!
Imagem 09 - Espetáculo: Alo, Dolly! (bastidores)
Imagem 10 - Espetáculo: Meu Amigo Charlie Brown
Imagem 11 - Espetáculo: Mônica Mundi
Imagem 12 - Espetáculo: Hair (bastidores)
Imagem 13 - Espetáculo: Zorro
Imagem 14 - Espetáculo: Tim Maia - Vale Tudo
Imagem 15 - Espetáculo: Calígula
Imagem 16 - Espetáculo: A Gaiola das Loucas
Imagem 17 - Espetáculo: Razões para Ser Bonita
Imagem 18 - Espetáculo: Xanadu (bastidores)


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