sexta-feira, 1 de março de 2013

Entrevista com Ruben Gabira








A experiência profissional de Ruben Gabira é um panorama dos grandes espetáculos do Teatro Musical, gênero que data de fins do século XX, com os chamados “book musicals”. Trata-se de um mercado que movimenta milhões ao redor do mundo e que exige profissionais altamente qualificados nas suas três principais frentes: a atuação, a dança, e a música. Na entrevista com o artista fica clara a necessidade de uma formação contínua em todas essas especialidades, uma vez que elas se complementam e têm grande importância nos musicais. Como em poucos tipos de espetáculo a fundamentalidade de todo o elenco fica nítida neste gênero, pois é exigida a habilidade em ao menos duas das modalidades citadas (considerando que a atuação é uma premissa ao canto e à dança neles), que usualmente são utilizadas de forma superlativa nas apresentações. Contudo, ver tais performances ao vivo é um privilégio cada vez mais intermediado pelas lentes das câmeras de espectadores que fotografam ou filmam o tempo todo, o que pode desconcentrar os artistas e atrapalha o público que prefere assisti-las através de seus próprios olhos. Acima de tudo, o olhar através de gadgets de toda ordem descaracteriza a principal característica de uma arte essencialmente humana na sua emissão e na sua recepção. Estas e outras questões são tratadas na entrevista que o ator, bailarino e cantor lírico concedeu ao Cultura Artfício. O mural de imagens de Ruben Gabira, em retrato de Guilherme Logullo ao centro da parte superior, é uma retrospectiva que mostra alguns dos muitos trabalhos nos quais atuou: "Brasil70 Musical" (fotos de Claudia Ribeiro); "A Chorus Line" (fotos de Guga Melgar); "La Cage aux Follies" (acervo pessoal); "Nacht der Musicals" (acervo pessoal); “Priscilla, Rainha do Deserto” (fotos de Caio Gallucci)”; e "Sway" (acervo pessoal).

1. Quais os primeiros contatos que você se lembra de ter tido com a arte como espectador(a)?

O meu primeiro contato como espectador de Teatro foi através da minha escola ginasial, que organizou em 1973 uma excursão para assistirmos à peça "Os efeitos do Raio Gama nas margaridas do campo", estrelada por Nicete Bruno e Beth Goulart (então estreante na carreira de atriz), que estava sendo apresentada com muito sucesso no Teatro de Arena de São Paulo. As novelas, assim como as peças de Teatro que eram adaptadas para a TV naquela época também foram uma grande referência e inspiração na minha carreira. 

2. Qual a sua formação?

Eu me formei inicialmente como ator em 1976 pela Contemporânea Escola de Artes de São Paulo, tendo como professores Maria Hilma (História do Teatro), Paulo Hesse (Dicção), Romano Domingues (Interpretação) e Ivan Lima (Expressão Corporal). Para a minha formação como bailarino estudei na Escola de Bailados de São Paulo, de 1977 a 1980. Além de ter sido aluno de Gil Saboya, Ricardo Ordonez, Nora Estevez e Ilara Lopes (método da "Royal Academy of Dancing"). Como cantor lírico fui aluno de Victor Prochet no Rio de Janeiro, de 1992 a 1996, e de Eliane Coelho em Viena (onde morei e trabalhei durante 12 anos), de 2000 a 2005. Como cantor de musicais estudei com a americana Maria Alzati a técnica do musical americano, de 1997 a 1999, ainda em Viena. Também frequentei cursos extras de sapateado americano, flamenco, e mímica.

3. Quando e como lhe ocorreu ser artista? Houve um momento no qual esta foi uma intenção clara ou foi algo que aconteceu?

A representação esteve presente na minha vida desde muito cedo. Quando eu era criança fui influenciado pela TV e adorava imitar tudo que via nas novelas e nos programas humorísticos da época. Durante o período de ginásio eu fui presidente do Centro Cívico da escola e, incentivado pela minha professora de Português, Dona Dalva, comecei a atuar em peças de teatro que acabavam sendo dirigidas por ela. Nas festividades cívicas da escola eu era sempre o orador da turma. Quando terminei o colégio e tive que decidir por uma carreira não tive duvidas, o Teatro foi a minha primeira opção.

4. Você pode nos contar um pouco da sua carreira?

O meu primeiro trabalho profissional foi em 1978 no musical infantil "Mônica e Cebolinha no Mundo de Romeu e Julieta", no Teatro Tuca, em São Paulo, com produção de Mauricio de Souza e Pelé. Devido ao sucesso da montagem, a temporada se estendeu até o final de 1979. Em 1980, período em que vivi no Rio de Janeiro, participei do show "Brazilian Follies", no Hotel Nacional, e do musical "Cem Anos de Espetáculos", da TV Globo, estrelado por Miéle, Sandra Bréa, Zéze Motta e Marco Nanini, com direção de Augusto Cesar Vanucci. De 1981 a 1982 fui integrante do Ballet de Câmara da Cidade de São Paulo, dirigido por Ricardo Ordonez e Ilara Lopes. Em 1983 fui escolhido para fazer parte do elenco de "A Chorus Line", o musical que revolucionou a Broadway em 1975 e que foi trazido para o Brasil por Walter Clark. Em 1985 participei da versão cinematográfica de "A Ópera do Malandro", de Chico Buarque e Ruy Guerra, que também a dirigiu. Seguiram-se depois disso musicais em teatro como "Miss Banana" (1986), com Regina Duarte; "A Estrela Dalva" (1987), com Marília Pêra; "Dzi Croquettes" (1988), com Lennie Dale; "A Pequena Loja dos Horrores" (1989); "Cinderela" (1989/1990), musical infantil de José Wilker; "Não Fuja da Raia" (1991/1992), com Claudia Raia; "Charity, Meu Amor" (1993); "A Gaiola das Loucas" (1993), com Jorge Dória e Carvalhinho; "Aladin" (1994), musical infantil de Marcello Saback; "Cabaret Yukali" (1995); "Amor Bruxo" (1995); e "Francisco de Assis, o Musical" (1996), com Ciro Barcellos. Na televisão participei do especial "Dançando Conforme a Música" (1990), apresentado por Luiz Carlos Miéle e Watusi na TV Manchete; e de "Chico Total" (1996), programa humorístico da TV Globo liderado por Chico Anisio (1996). Em 1997 fui para Viena/Áustria a convite de Alonso Barros para participar do Festival de Verão de Ammstetten com o Musical "Kiss Me, Kate", de Cole Porter. Seguiram-se trabalhos em musicais como "La Cage aux Follies"(4 produções diferentes); "Cabaret"; "The Rocky Horror Show"; "Joseph and the Amazing Technicolor Dreamcoat"; "Evita"; "The King and I" e "West Side Story" [em Insbruck (Áustria) e Bozano (Itália), ambos como Bernardo]. Como ator fui integrante do Josefstadtheater de Viena nas peças "Aline, ou Viena em Outra Parte do Mundo", de Adolf Boiler; "O Papagaio Verde", de Arthur Schnizler; e "O Doente Imaginário", de Molière. Como cantor lírico participei da ópera moderna "Frida Kahlo", em Recklinghausen/Alemanha; "Homenagem a Strauss", na Opera de Câmara de Viena; e "Orfeu em Cima da Escada", ópera infantil inspirada em “Orfeu e Eurídice”, de Glueck, no Teatro Odeon/Viena, como o personagem principal masculino. De volta ao Brasil, a convite de Claudia Raia, participei como ator, cantor e bailarino do musical "De Pernas pro Ar" (2009/2010). Ainda no teatro musical, participei em 2011 de "Brasil70 Musical" e "Os Saltimbancos", de Chico Buarque. No mesmo ano participei como cantor no filme "Giovanni Improtta" estrelado e dirigido por José Wilker. Em 2012 fiz a transexual Bernadette no musical "Priscilla, a Rainha do Deserto".

5. Quais artistas lhe influenciaram?

Bibi Ferreira, Paulo Autran, Sérgio Cardoso, Sérgio Brito, Fernanda Montenegro, Cacilda Becker, Marilia Pera, Elis Regina, Maria Callas, Rudolf Nureiev, Vaslav Nijinsky, Luciano Pavarotti, Caruso, Robert de Niro, Dustin Hoffman, Al Pacino, Glenn Close e Meryl Streep entre muitos outros.

6. Quando passou a se considerar profissional?

Em 1978, quando consegui o meu DRT (sigla de Delegacia Regional do Trabalho, usada nas Artes Cênicas como referência ao Atestado de Capacitação Profissional, ou seja, o registro profissional dos seus profissionais), através do Sindicato dos Artistas de São Paulo, mesmo ano no qual debutei no Teatro. Foi uma dupla emoção!

7. Qual era a ideia que você tinha da profissão antes de exercê-la?

Que eu buscaria a oportunidade de sempre me aprimorar e superar através de novos desafios artísticos, de crescer como ser humano, e que eu conseguiria viver desta profissão. E que o sucesso e a fama seriam consequência disso tudo!

8. Qual é a ideia que você tem da profissão hoje que a exerce?

Continuo tendo os mesmos objetivos!

9. Como é o seu dia de trabalho?

Quando estou envolvido em algum trabalho, além do horário de ensaio, estou sempre em casa estudando e esmiuçando as possibilidades de interpretação que este personagem pode me oferecer como ator. Quando estou livre, procuro ver espetáculos, ler bastante, fazer ginástica, correr e estar sempre com os amigos, pois o lazer também é uma forma de me reabastecer.

10. Seu trabalho foi beneficiado com a internet e as redes sociais? Como? 

"SIM" no plano prático, pois você pode pesquisar, divulgar e até se promover através da internet – algo fantástico e muito veloz! E "NÃO" no sentido humano, pois tudo acabou meio que ficando virtual... As relações se tornaram mais artificiais, mais distantes. A gente não escreve mais cartas e sim emails. Estamos nos comunicando mais virtualmente do que fisicamente... O olhar humano foi substituído por iPods, tablets e smartphones. O espectador às vezes leva este comportamento para o teatro. Para quem está no palco isto atrapalha, desconcentra! Sinal dos tempos... Talvez!

11. É possível pagar as contas tendo a arte como ofício? Como você faz?

Não é fácil, mas é possível! Já fui muito inconsequente com dinheiro na minha juventude, hoje em dia tento priorizar uma boa parte do que ganho e guardar para períodos em que a demanda de trabalho possa ser menor!

12. Como você acredita que será o futuro da sua profissão?

Desejo que tenhamos no futuro nesta profissão e na Arte em geral menos celebridades e mais artistas de verdade. Tudo ficou meio fácil. A nossa profissão ficou um pouco devassada, e eu acredito que isto se deva em parte à TV, que promove o sucesso meteórico a qualquer custo. Às vezes acho que o teatro e a nossa dramaturgia se transformaram num subproduto da televisão! Quero acreditar também que no futuro teremos uma Política de Cultura mais justa e eficaz, para que projetos de real valor cultural não fiquem à deriva e que tenham os mesmos direitos de subvenção que as outras produções.

13. Fale sobre o que você gostaria do seu trabalho, mas nunca lhe perguntam.

Gostaria de dizer que, apesar de estar sempre na corda bamba nesta profissão, sou muito feliz! 


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4 comentários:

  1. Muito boa entrevista! Parabéns e sucesso sempre!

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  2. Bela entrevista, nos permitiu conhecer a luta e o trabalho consistente de Ruben Gabira. Parabéns.

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  3. Ótima entrevista. Creio que conseguiu nos passar uma idéia da riqueza do trabalho e da tenacidade do autor. Parabéns!

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  4. Parabéns pelo esforço, dedicação, seriedade e bons sentimentos com que nutre a vida e a profissão!

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